Amor, aquele sentimento despretensioso!
Mais amor, por favor, encontro eu ali ao lado aos olhos de todos, numa importante revista semanal, cheinha de razão.
A era do capitalismo vai-se construindo ao longo da história, vista com bons olhos, os da evolução. O que parece que ninguém quer ver, é o impacto que tem no amor, aquele sentimento despretensioso e genuíno, que nasce no coração e se espalha pelo corpo todo, engolindo o sangue, a pele, os olhos e as palavras.
O problema é que o terreno onde pode crescer carece de um adubo muito especial, e está minado por outras supostas grandezas, as que valem dinheiro, as carreiras e muito sucesso, o exacto local onde não cabe o gesto de companheirismo, onde a competição e a ambição matam a harmonia, válida apenas por si só ( lembram-se de Kant?) .
Começamos cedo, muito cedo, lembro-me perfeitamente dos dias em que acompanhei pequenos no futebol, com claques acesas de mães e pais que não sabiam perder, e que forneciam aos seus pequenos rebentos doses industriais de raiva, palavrões, rivalidade e falta de desportivismo.
Fugi depressa dali, mas nem por isso me livrei de todos os males. Apercebi-me de que não consigo, a praga é grande, chegou, viu e venceu, devorou pessoas, muitas pessoas, se não a combatermos num ápice engole o mundo, a natureza, os restantes Homens e os animais, e cabe-nos a todos contrariar esse fim presumido, mas felizmente ainda não assumido.
O que importa para os meninos crescerem não é serem os melhores, é serem felizes conforme forem conseguindo, e sentirem-se integrados numa comunidade onde em cada dia e a cada gesto, alguém abdique porque outro alguém está menos bem.
O que deve contar para que um adulto se sinta realizado, serão também os sorrisos que espalha todos os dias, desde que amanhece até que anoitece, podendo reservar-se alguns para os sonhos da noite, os famosos guardiões do inconsciente, não vá o pobre sentir-se desprotegido e ficar muito zangado.
O que é fundamental no idoso que olha para o caminho percorrido, é sentir que pertence a este mundo tanto quanto o bebé que acabou de nascer, e que mesmo já sem força e com pouca esperança, tem alguém que o respeita na enormidade do que já viveu, aprendeu e lhe fez doer.
O resto, o que parece vencer na glória do povo, as vitórias do dinheiro e a morte da humildade, são um pântano escorregadio onde caímos vezes demais, sem perceber que um dia o tempo vai ser engolido pelas horas do cansaço, e pouco haverá a fazer.
Nesse dia malvado, não seremos pessoas. Seremos construções de carne e osso, movidos a uma razão infeliz, um combustível caríssimo, pago com a vida e o arrependimento.
E se o arrependimento matasse! Mata, mata mesmo… Mata por dentro, quando conseguirmos descobrir que em vez de querermos ser os primeiros, ganharíamos muito mais em termos sido um entre tantos, a um importante tijolo na construção do castelo. Uma única gota, por perfeita que seja, nunca fará um mar feliz. Está calor, aproveitem, vão até ele e perguntem-lhe…
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Carla Raposo Ferreira, é Psicóloga e escreve às Segundas-feiras no Rio Maior Jornal.