Com o avançar dos certificados de vacinação, códigos QR para tudo, desde menus de restaurantes a check-ins em voos, os pagamentos digitais, reconhecimento facial e muito mais, parece impossível manter qualquer privacidade na sociedade de hoje.
Privacidade e a sociedade
O problema não é a falta de privacidade – isso acabou há vários anos, mesmo antes de eu nascer. O problema é a não preocupação da sociedade em relação à falta de proteção da nossa privacidade. Desde o momento em que nascemos é nos atribuído um conjunto de números que nos seguirão para o resto da nossa vida, quer queiramos ou não. Mas isso não me preocupa – todos queremos uma prova em como nascemos e um registo dos nossos dados. O problema é que cada vez mais a Empresa Y e a Empresa Z utilizam estes dados, sem uma razão. E os mecanismos que nos deviam proteger destas ações estão a desaparecer dia após dia.
Muitos especialistas referem que a privacidade acabou assim que os telemóveis surgiram – momento a partir do qual levamos este dispositivo para todo o lado, e partilhamos a nossa vida com ele.
O que mais me assusta com o aparecimento do Covid-19, em relação à privacidade, foi a rapidez com a qual a sociedade aceitou certos comportamentos e ações relacionados com os nossos dados (e vida em geral).
Numa época em que tudo é feito online, desde encomendar comida até à marcação de uma consulta, devemos parar e pensar no que estamos realmente a transacionar. Não digo que não devamos confiar nos serviços online que existem, o que seria insensato – eu mesmo os utilizo, alguns de forma diária. O que digo é que o leitor, da próxima vez que estiver online, pense no que realmente está a “trocar”.
O caso da Pizza
É cada vez mais comum ouvir alguém a referir o seguinte:
Encomendei uma pizza de ananás ontem através do serviço X. Hoje, na app Y, vejo anúncios do serviço X, com a pizza de ananás que comi ontem.
A verdade é que, em conjunto com a pizza de ananás que comprou, vendeu também as suas preferências e os produtos que encomendou. Pode não ter conhecimento disso (o mais normal é não ter), mas essa transação ocorreu, e ocorre mais vezes do que pensa, durante o seu dia a dia.
RGPD
Vivemos numa época em que existem regulamentos para tudo – desde a forma como registos são guardados até como são eliminados – mas será que as regulamentações são mesmo cumpridas? Em relação ao RGPD, muitos acham que veio salvar a nossa privacidade, pois têm de assinalar uma pequena caixinha assim que chegam a qualquer website ou serviço (muitos ainda esperam pelos cookies prometidos…). Tudo isto não passa de jogos mentais, criados pelas grandes corporações, nas quais confiamos todos os dias com os nossos dados.
Cada vez que utilizo um produto de uma destas corporações, penso sempre: “Se o produto é gratuito, então tu és o produto!”. Pense nisto, na próxima vez que utilizar qualquer aplicação e/ou serviço.
1984
O livro 1984 (Nineteen Eighty-Four) é um romance que retrata a vigilância do governo do Reino Unido. Publicado pela primeira vez em 1949, bem o autor sabia como o seu livro iria ser relevante na época atual.
Em 2021, estamos em plena vivência do argumento deste best-seller, que todos devemos ler. Pode ser difícil manter a sanidade depois de ler esta obra que era de ficção em 1949, e que hoje vemos simplesmente acontecer!
Desde a novilíngua, ao reescrever da história, pensando pelo elogio do isolamento, temos muito em que refletir.
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Imagem de capa por Lianhao Qu no Unsplash.