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Bulling

Praxe Académica ou a Legitimação do Bulling

A Praxe e o Bulling

A luta pelos direitos humanos é de sempre.

Podemos identificá-la logo a partir de Moisés quando invoca, perante o faraó, o direito dos povos à autodeterminação. Ou do Cristianismo, com a defesa da igualdade de todos os homens numa mesma dignidade. Ou, mais recentemente, mas ainda remotamente, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada em França, em 1789.

Surpreende, por isso, que as camadas mais jovens da sociedade e, supostamente, mais letradas, se submetam a atos indignos em nome de uma tradição assente em princípios que ofendem as mais elementares regras de convivência humana.

Sob a batuta de auto denominados líderes – que, se o fossem, saberiam que a primeira característica de um verdadeiro líder é o respeito pelo liderado!- este é o tempo em que, ciclicamente, vemos os jovens universitários submeterem-se a praxes onde são subjugados, vilipendiados e, não menos mau, que a todos nós, cidadãos de uma república soberana assente na dignidade da pessoa humana, ofendem.

Este é o tempo dos passeios pela cidade de jovens com penicos enfiados na cabeça – não fossemos nós deixar passar despercebido o momento da integração no espaço universitário -, das flexões sem fim, do suor e das lágrimas por uma causa que não entendemos, do crescimento incentivado pelo consumo de bebidas alcoólicas.

Portugal é, para quem esteja esquecido, uma Republica soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Assim o dita a Constituição da República Portuguesa.

A dignidade da pessoa humana concretiza-se no campo dos direitos fundamentais. É a dignidade da pessoa concreta, do homem e da mulher cujos direitos fundamentais a Constituição enuncia e protege.

A dignidade da pessoa humana é da pessoa em qualquer dos géneros e pressupõe a de todos os outros e, por isso, cada pessoa, tem de ser compreendida em relação com as demais.

São variados os instrumentos jurídicos, incluindo de cariz internacional e vinculativos do Estado Português, dos quais resulta a proteção desta dignidade e, com ela, a proibição de maus tratos, escravidão, tratamentos degradantes ou desumanos…

A universalidade da educação está, há muito, consagrada no território nacional e, desde 1986, que é obrigatória a escolaridade, primeiro, de nove anos, e, atualmente, de 12 anos.

Segundo os Censos de 2011 (os de 2021 ainda não apresentaram os resultados finais), 15% da população com mais de 23 anos, tinha completado o ensino superior, valor que, assim, duplicou em 10 anos. E 50% da população concluiu o 9º ano de escolaridade, tendo-se a taxa de analfabetos reduzido para 5% da população.

Não obstante, num estudo realizado pela PROTESTE em 2012, 1/3 dos inquiridos afirmou ter sido vítima de bulling na escola, no trabalho ou na Internet. Uma parte significativa destas pessoas mantem recordações que as perturbam na idade adulta. São situações em que um inferioriza o outro, espalhando comentários, recusando socializar-se com a vítima ou impedindo que outros se socializem com ela, intimidando-a, ridicularizando o seu modo de vestir, a sua etnia, até as suas incapacidades…

Aos pais e encarregados de educação que, ao longo do período escolar dos seus filhos, revelam – e bem!- preocupação com estes atos, cabe, nesta fase de integração na universidade, tratar de insuflar nos mesmos a capacidade para recusarem submeter-se a atos indignos e participarem, seja por que forma for, no sofrimento de outros.

A nós, comunidade, está reservado o papel de não legitimar jovens abusadores, recusando ver nestes atos uma qualquer forma de inclusão. Tolerar práticas indignas é pactuar na perpetuação das mesmas.

A luta pelos direitos humanos é de todos e para todos!

Manuela Fialho

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Manuela Fialho
Manuela Fialho nasceu no Cartaxo, residindo desde a infância, em Rio Maior. Empenhada no movimento associativo, designadamente o regional onde integra os órgãos sociais de várias associações e participou na fundação e instalação de outras, vem, desde há alguns anos, colaborando com a imprensa local. É membro do Centro de Investigação Joaquim Veríssimo Serrão, ali integrando o Conselho de Redação das Revistas MÁTRIA XXI e MÁTRIA DIGITAL. Publica em revistas de cariz jurídico. Tem colaborado como conferencista e/ou docente com o Centro de Estudos Judiciários, com a JUTRA –Associação Luso Brasileira de Juristas do Trabalho, com a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e com a da Universidade Nova de Lisboa. É juíza desembargadora.

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