Onde quer que esteja, sei que está a sorrir!
Serena, formosa, esplêndida, talentosa, discreta, observadora, cordial e muito lutadora – é assim que começo por definir a minha eterna amiga pessoal, Eugénia Lima. Recordo, com muito amor, toda a sua postura e resiliência na prática da sua arte – a beleza de tocar um acordeão, de animar um público e movimentá-lo, fazendo-o sorrir com a sua musicalidade.
Mulher, nascida num mundo onde a história é narrada por homens, desde muito cedo viu-se obrigada a lutar para atingir os seus objetivos pessoais e profissionais. A singularidade do seu timbre acompanha várias gerações (incluindo a minha, claro). O contacto com o seu pai, afinador de acordeões, tornaram-na uma fanática pelo o instrumento, que desde cedo vera as suas brincadeiras resumidas às teclas e desde logo pequenos sons acabaram por surgir.
Ser-me-ia extremamente agradável viajar pela sua história de vida, descrevendo pormenorizadamente cada conquista que levou a cabo na sua trajetória, mas seria um registo muito habitual. Assim, caro leitor, pretendo dar-lhe conta de alguns dos motivos que me mobilizaram a esta pequena reflexão.
No passado dia 6 de novembro, no âmbito das Comemorações do 185º aniversário da elevação de Rio Maior a Concelho, realizaram-se várias atividades, incluindo a XIX Gala de Acordeão Eugénia Lima. Um conjunto de pensamentos nostálgicos atravessou a minha mente! A pandemia privou-nos de assistir a momentos culturais nos espaços a que estávamos habituados, de sentir as emoções e vibrações fisicamente. Este espetáculo, que tanta felicidade trazia à minha amiga, esteve de regresso. Estar no Cineteatro de Rio Maior e assistir às diversas atuações foi como uma viagem ao passado e, por momentos, recordei a sua presença naquele palco, através da delicadeza e amor que cada artista apelou na sua performance. Saí daquele evento de coração cheio!

Em março e abril deste ano, preparei uma semana em sua homenagem, onde diariamente eram publicados conteúdos nas redes sociais sobre a sua rota profissional. Fiquei riquíssimo! Relembrei a sua paixão pelos carros, o exigente caminho que percorreu até poder pisar os palcos, a indicação no Dicionário Mundial de Mulheres Notáveis, a paixão pelo ensino, a carta de condução (sendo das primeiras mulheres do país a tirá-la), e muitas outras aventuras que marcaram o seu percurso…
Apraz-me fazer referência à última prenda que me oferecera em vida. Brindou-me com um CD seu, escrevendo uma dedicatória que provoca certa emoção, dizendo que era ‘’uma recordação da amiga velhinha’’. Que mensagem tão próxima, carinhosa e memorável!
Da mesma forma que Amália nos deixou a sua grandeza no fado, Eugénia Lima deixou-nos no acordeão. Só mesmo estes seres especiais, ‘’que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando’’, conseguem deixar este registo tão próximo de cada um de nós.
No fim, mantenho-a viva no meu coração, eternizando a sua pessoa e as suas palavras – ‘’Minha vida, meu sonho’’- é este um dos lemas que cada um de nós devia tomar como regra na sua curta e dura viagem aqui…
In proximum
António Coito é um jovem riomaiorense e escreve às quartas-feiras no RMJORNAL
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