Cidadania
O direito à liberdade é sem qualquer dúvida um dos meus nortes existenciais. Desde que o limite da integridade física e mental alheia seja respeitada, não há questão que me balize no que toca à liberdade pessoal de cada ser humano.
As aulas de cidadania, que fazem parte do programa educativo dos nossos jovens, pretendem fornecer recursos que potenciem a possibilidade da existência destes e de outros direitos consagrados, como a igualdade de género, a sustentabilidade do planeta, a educação para a saúde e para a sexualidade e a educação financeira, entre outros.
Está incluída no ensino, e merece o mesmo destaque e importância do que qualquer outra, uma vez que integra um conjunto de conhecimentos essenciais que constituem a evolução mais integral das nossas crianças e jovens.
Sabemos que nem todas as pessoas se pautam por estas directrizes. Sabemos que falar de sexualidade, igualdade de género, interrupção voluntária de gravidez ou outras temáticas, pode ser desorganizador para quem seja de uma linha mais conservadora, mas a educação necessita de acompanhar a evolução, e privar os jovens do contacto com toda esta realidade, é privá-los do tempo presente.
Um dos argumentos utilizado pelos pais que insistem na batalha judicial travada há anos, devido à escolha dos seus filhos não frequentarem a disciplina, é que a mesma é uma disciplina de atitude, e que como tal, não compete à escola, como se na escola apenas se pudesse aprender dados teóricos e consistentes com os livros universais da pedagogia concreta, e não pudesse ser um espaço de reflexão e de aprendizagem sobre o ser humano, sobre a necessidade da igualdade e a necessidade do respeito pela diferença, como se no lugar onde se aprende, tudo o que toca à formação da personalidade, ficasse de fora.
Pergunto, como é que tal seria possível. Como é que um professor ensina sem atitude, sem envolvimento e sem presença de si.
Pergunto como é que as crianças se envolvem no mundo actual sem o conhecerem de forma abrangente, livre, isenta de dogmas e de condenações, e como é óbvio, considero impossível esse tipo de ensino. Talvez esse ensino tenha existido no tempo dos nossos avós, em que a cartilha os obrigava a soletrar de cor a tabuada de matemática, a cantar em ritmo certo os rios de Portugal e a recitar, sem qualquer hipótese de erro, as funções gramaticais da nossa língua. Sem rodeios, sem hesitações. Mas felizmente, estamos noutra era.
Numa era em que na escola se aprendem letras e números, conhecimentos teóricos e trabalhos científicos, dados concretos e abstractos sobre biologia, língua portuguesa, filosofia e geometria, mas onde aprendemos também a reflectir. E a escolher se queremos prejudicar o planeta onde habitamos, ou se preferimos protegê-lo, encarando esta última dentro de uma conduta de responsabilidade social.
Estamos ainda na era em que se vai subindo a pulso na tentativa de encontrar um caminho mais aberto para cada um ser o que é. Pare decidir sobre o seu corpo e as suas convicções, isento de pressões que o passam limitar. E neste mundo, a atitude está na escola, na família, na sociedade, e em todos os elementos que a compões. Não é possível um muro recto entre estes dois mundos.
Estamos na era da mudança, e os jovens que conheço gritam-me isso no jeito global com que vivem. Eles não sabem, mas gritam, e depositam-me no colo uma esperança gigante no mundo melhor. Não os calemos, jamais. Que se calem antes os que em nome de uma pseudo liberdade, escolhem não escolher essa mesma liberdade.
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Carla Raposo Ferreira, é Psicóloga e escreve às Segundas-feiras no Rio Maior Jornal.