Mais um ano a terminar! As horas, os dias, as semanas, os meses e os anos vão passando, trazendo sempre novos desafios — “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, como dizia Camões. Há um ano, os portugueses escolheram a palavra que melhor definiu 2023: “Professores”. Esta escolha, creio eu muito bem feita, poderia ter servido de incentivo para alguns ajustes no sistema educativo português. Seria exagerado dizer que pouco ou nada foi feito, ainda que, olhando para o panorama atual, fica mais elegante utilizar a expressão “estagnação”, não comprometendo assim nenhuma fação política. Esta situação deve deixar-nos, a todos e sem exceção, reflexivos e com um verdadeiro sentimento de desânimo. Em 2025, as várias crises na Educação vão agravar-se e devemos estar preparados para todos os cenários. Assim, proponho, em jeito de retrospetiva, uma análise dos aspetos mais relevantes que marcaram o ano que agora finda.
De uma maneira geral, tem faltado transparência e honestidade para com os portugueses, em diversos domínios, e a Educação não fica atrás. Nas últimas semanas, “a batata quente” tem sido passada constantemente para o Governo anterior. Contudo, parece-nos óbvio quem mentiu nas mais recentes estatísticas relativas ao número de alunos sem professores. É compreensível que os números sejam uma forma de medir a qualidade das 15 medidas tomadas no início do ano letivo. Em todo o caso, a divulgação genuína destes resultados só vem reforçar uma conclusão já retirada, isto é, a impossibilidade de dar respostas eficientes a curto prazo com algumas destas medidas. A mentira e a desonestidade, no caso, só aumentam o desagrado e a contestação.
De acordo com os números divulgados pela FENPROF, verifica-se que, até agora, cerca de 30 mil alunos estão sem pelo menos um professor (mais de mil turmas). Na prática, as medidas mais recentes, como o concurso extraordinário, que viu aumentar o número de “professores” sem profissionalização (com aspas, porque efetivamente não o são), ou o regresso de professores reformados, deixam a qualidade do ensino mais fragilizada. Por serem medidas “penso rápido”, como afirma António Carlos Cortez, acabam por descolar ao fim de algum tempo. Aguardemos, expectantes e ansiosos, pelas prometidas declarações do Senhor Ministro da Educação, previstas para o fim do 1.º Período, que em teoria já terminou, mas não tarda a ressuscitar!
Noutra perspetiva, parece-me pertinente abordar uma questão f mencionada ultimamente nos meios de comunicação social por diversos comentadores e comummente mal interpretada: o mito de que a carreira docente é pouco procurada. Se é certo que esta profissão tem perdido atratividade, o que pode contribuir para uma perceção menos positiva sobre o seu futuro, também é igualmente verdade que, todos os anos, dezenas de estudantes não ficam colocados nos mestrados em ensino. Infelizmente, estas questões não têm lugar no debate público, porque, convenhamos, levantar estas problemáticas seria expor aquilo que já se intui: a falta de investimento na educação. Falar de poucas vagas nos mestrados em ensino, da escassez de docentes para assegurar as cadeiras dos mestrados ou das condições precárias dos professores cooperantes das escolas de estágio seria como destapar um escândalo que preferimos ignorar. Afinal, quem quer encarar aquilo que, por vezes, é mais confortável manter na penumbra?
Ainda assim, ao fim de tanto tempo de crise e negociações, no passado dia 18 de dezembro, estas questões tiveram lugar no Comunidado do Conselho de Ministros, o que poderá contribuir para alguma esperança estrutural. Falou-se do incentivo à formação prévia (inicial) de professores, através da atribuição de bolsas, de medidas de recrutamento, nomeadamente na simplificação de abertura de alguns concursos, e de apoios aos professores cooperantes (esperemos nós, longe dos 89 euros referidos em negociações, para um professor que acompanhe 4 estagiários). Quem sabe, num futuro próximo, sejam tomadas algumas medidas para combater os resultados dos últimos relatórios internacionais, que colocam Portugal em situação vulnerável no que diz respeito às competências de literacia dos nossos jovens e adultos, projetando um caminho de excelência no ensino, marcado pela qualidade e pelo rigor, e ligeiramente afastado do entusiasmo desmedido provocado pelas transformações digitais e suas potencialidades, que só servem quando os docentes estão munidos de conhecimentos científicos sólidos dos equipamentos, mas sobretudo dos conteúdos programáticos.
Termino com uma homenagem a António Sampaio da Nóvoa, agora jubilado e professor emérito, que na sua última obra, Professores — Libertar o Futuro, deixa bem reforçadas as três grandes ausências desta sociedade contemporânea — o lugar social e intelectual do Professor, a liberdade da carreira docente e as perspetivas para o futuro. Ainda neste livro, Sampaio da Nóvoa considera que “estamos a viver a maior transformação da história da educação e da pedagogia”. Por isso, torna-se imperativo acolher dignamente os jovens professores, preparando-os da melhor forma, pois são eles os responsáveis pela renovação da Vida desta profissão. Está nas mãos da Política decidir e construir uma estrutura consistente — fica aqui o apelo aos atores responsáveis pela pasta da Educação. Feliz 2025!
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