Por: João Teodoro Miguel
Hoje, dia 22, é comemorado o Dia Mundial da Água.
Por solicitação do Rio Maior Jornal, irei abordar neste artigo, apenas a temática do setor de abastecimento público de água em Portugal. Assim, baseado no último Relatório Anual dos Serviços de Águas em Portugal de 2022 (RASARP 2022) que sintetiza a informação mais relevante, mencionada a 31 de dezembro de 2021, sobre o setor de abastecimento público de água, na vertente da atividade regulatória.
Salienta-se, que a Entidade Reguladora ERSAR, dos dados recolhidos, sinalizou a necessidade urgente de melhoria no setor, como a adesão ao serviço, a reabilitação de condutas, a ocorrência de inundações, a carência de uma melhor gestão, relativamente, às perdas de água e a água não faturada.
No que respeita aos encargos mensais suportados pelas famílias portuguesas em 2021 com estes serviços, verifica-se que o utilizador final teve, em média, para um consumo de 10 m3 de água, um encargo mensal de 25,43 €, sendo o abastecimento de água o serviço que acarreta mais custos (11,39€).
É de salientar também que no próximo RASARP, aplicar-se-á a 4.ª geração, ou seja, um novo critério de avaliação: a circularidade e a valorização. Depois de muitos anos, as preocupações com a economia circular e com a sustentabilidade entrarão para a avaliação das atuais 354 entidades estatais e municipais que, em gestão direta, delegação ou concessão, operam, em alta, em baixa ou em ambos, os sectores da água e dos resíduos.
Das mais de quinhentas páginas apresentadas, destaco três indicadores que serão certamente dos mais importantes por contribuírem negativamente para a insustentabilidade do sector: falamos da reabilitação de condutas, das perdas de água e da recuperação de custos.
Na verdade, a identificação das necessidades de fazer um conjunto de investimentos na reabilitação do setor já é conhecida há muito tempo. Assim como, a urgente necessidade do levantamento do cadastro das infraestruturas. Não menos relevante a indispensável implementação uma verdadeira otimização da gestão dos serviços. Tristemente, os dados agora publicados pela ERSAR mostram que nada melhorou nesta última década.
Aliás, à exceção pela positiva de algumas Entidades que fizeram um trabalho meritório, sendo pouco mais de uma vintena de Entidades Gestoras. As restantes vão mantendo a “coisa “a funcionar, sem qualquer tipo de critério e planeamento e, só atuam, quando a avaria ou a rutura aparece. Quanto ao envio de informação à Entidade Reguladora, na sua maioria, a informação é enviada sem qualquer rigor técnico ou mesmo sendo omitida.
Recordo-me que há dez anos, uma quantidade significativa de Entidades Gestoras, fazia a reabilitação de condutas e outras infraestruturas com resultados bastante positivos. Agora, quer em alta (captação), quer em baixa (distribuição ao consumidor final), estamos a renovar, muito, muito pouco.
Examinemos, na (alta), as Entidades Gestoras recuperam as suas condutas, em média, 0,2% ao ano, enquanto, para assegurar uma renovação eficiente, precisariam garantir, em média, uma renovação de 1 a 4%, a esta cadência de 0,2%, apenas teremos a renovação feita destas situações decorridos 5 ou seis gerações de consumidores.
Relativamente à renovação de condutas em (baixa), também é insuficiente, apenas cerca de 0,6% tem sido efetuada. Para que o indicador fosse classificado, pelo menos, como mediano deveriam reabilitar-se entre 0,8 e 1% ao ano. Mesmo a este ritmo, seriam necessárias 3 gerações de consumidores para renovar todas as condutas.
Não nos podemos esquecer que as alterações climáticas são uma realidade e, trazem-nos incertezas transversais a toda a Humanidade. Particularmente também neste setor, é inaceitável ignorar a existência de infraestruturas velhas, que levam a perdas inconcebíveis de água. Nada fazer, considero um crime contra a Humanidade.
O valor mediano do indicador de perdas reais para o serviço em alta e para o serviço em baixa, apresentou uma evolução favorável entre 2017 e 2019, mas esta tendência inverteu-se em 2020, resultando esta ineficiência na perda de cerca de 197 milhões de metros cúbicos de água na rede, por ano. Nas perdas de água e, na não faturação é muita a água que se perde em Portugal. Também não podemos esquecer as perdas aparentes por erro de medição de contadores, por uso doloso ou por consumos autorizados não faturados.
Estes valores atrás mencionados encheriam algumas barragens em Portugal. Se tentarmos imaginar o que as gerações vindouras poderão pensar de nós, logo que entrarem em vigor as situações de escassez projetadas em relação ao recurso água potável, ficamos de imediato conscientes do modo escassamente sustentável como administramos atualmente este recurso.
Precisamos de um compromisso nacional e local dos políticos eleitos, com um verdadeiro, ACORDO PARA A ÁGUA. O Regulador deveria ter uma intervenção mais direta sobre as Entidades que não cumprem os objetivos nacionais. O Estado, como primeiro responsável por este setor, é o primeiro a não tomar medidas responsabilizadoras sobre quem é RESPONSÁVEL pela gestão de tão importante atividade.
Assegurar a sustentabilidade económica e financeira do setor, incentivando as agregações, ampliando a diferenciação qualitativa dos recursos das entidades gestoras é imprescindível. Estamos a viver alterações profundas na digitalização dos sistemas, procurando melhores instrumentos de planeamento e gestão, assegurando uma maior e eficaz eficiência na gestão do património e na tão urgente e necessária reabilitação de todas as infraestruturas. Se vamos acompanhar estas oportunidades? Pessoalmente não acredito!