Passa(o)tempo nas Séries
Segundo o estudo “Os Jovens em Portugal, Hoje” organizado pela fundação Francisco Manuel dos Santos, o passatempo preferido dos jovens (43%) é ver filmes e/ou séries. Logo, as séries e os filmes devem possuir alguma característica que atrai os jovens da mesma maneira que o mel atrai as abelhas ou as garrafas de uísque atraem o Rui Reininho.
A partir de agora, sinto necessidade de alertar o leitor para o que aí vem, uma vez que vamos entrar em caminhos pantanosos. Tudo o que será escrito daqui por diante será pura especulação vinda da minha cabeça, portanto, cautela é aconselhada.
A meu ver, este fenómeno de procura desenfreada por séries justifica-se por 3 razões. Na verdade, são 4 mas dizer que são 3 é muito mais apelativo para a pessoa que está a ler.
A primeira, e a mais óbvia, é relativa à facilidade de acesso. Qualquer pessoa tem à sua disposição várias plataformas de streaming com milhares de conteúdos. E ainda, para as classes mais desfavorecidas que não têm posses financeiras para subscrever 17 plataformas diferentes, existem variadíssimos sites piratas com uma oferta quase inesgotável. Oferta esta que chega a ser uma afronta ao meu poder de decisão.
Quer dizer, quando estou num café nem consigo escolher entre o Ice Tea de Manga e o Ice Tea de Limão sem deitar 3 gotas de suor, fazendo com que ceda sempre à pressão e acabe a pedir um rissol de camarão, e esperam que eu consiga escolher entre as 3 487 comédias românticas na Netflix? Acho provocativo.
A segunda razão, prende-se pela homogeneização dos temas de conversa e interesses. Saiu a última temporada da Casa de Papel? Podem ter a certeza que 70% das conversas de café nessa semana vão ser sobre isso. E nós, como bons seres humanos que somos, não aguentamos ficar de fora da discussão.
A terceira razão é, na minha consideração, a mais importante, e aquela que me trouxe aqui. O efeito anestésico que as séries oferecem. Para justificar isto basta olhar para os números. Quais são as séries com mais procura nas últimas décadas? A resposta, excetuando fenómenos como “Game of Thrones“, é sitcoms.
As sitcoms – abreviatura da expressão inglesa situation comedy – são um sub-género das séries caracterizado pela comédia, risos enlatados e cenários quotidianos como o trabalho ou convívios com amigos. Alguns pesos pesados deste género são séries como “Friends”, “Seinfeld” e “The Office”. Estas produções podem não ser obras-primas a nível narrativo ou temático como “Breaking Bad” e “Succession” mas representam muito mais para quem as vê. São um refúgio.
Quantos de nós já chegámos a casa totalmente exaustos de um dia de trabalho ou escola e não nos apetecia ver nada muito exigente mentalmente mas que também não fosse propriamente infantilóide? Queremos um meio termo entre um documentário sobre os hábitos de caça de uma tribo chilena e o Zig Zag. Queremos esquecer os problemas pessoais durante 20 minutos enquanto vemos o Joey a vestir as roupas todas do Chandler. E as sitcoms oferecem precisamente esse escape. São o paracetamol da alma. Podemos colocar o nosso cérebro em modo stand-by e rir.
E como se isto não bastasse, ainda conseguem ser a melhor forma de companhia que muita gente tem. Tanto para pessoas solitárias como para pessoas sociáveis, aquele momento ao final da noite proporciona uma companhia que é só nossa.
Creio não estar a exagerar quando digo que estes pedaços de arte já salvaram a vida a muita gente. Os testemunhos estão aí, só temos de baixar o som da televisão para os conseguirmos ouvir.
Bruno Rolo, é um Jovem Riomaiorense de 21 anos, Licenciado em Marketing Turístico e escreve às quartas-feiras no Rio Maior Jornal e respeita o AO90.
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